Há diversos experimentos a demonstrar a ausência de racionalismo decisório, mas, nos cursos de Direito, grande parte dos professores segue ensinando, sem constrangimentos, o racionalismo decisório.
Dan Ariely, professor de economia comportamental da Universidade Duke e do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), é autor de Previsivelmente Irracional. Ariely afirma que as decisões que as pessoas tomam - mesmo as mais milimetricamente calculadas - são contaminadas por sentimentos ou influências imperceptíveis. E essas decisões costumam ser tomadas sem qualquer racionalidade.
Sem perceber, os indivíduos, frequentemente, deixam de usar a razão. Isso acontece porque as decisões humanas são guiadas por fatores que passam despercebidos pelo cérebro. É possível estimular as pessoas a ver a realidade de um jeito distorcido - e elas acharão que estão vendo tudo da forma mais lógica possível.
Se uma pessoa é estimulada a adotar certa perspectiva, ela pode acabar percebendo o mundo de forma diferente - o que se reflete em suas decisões. Um exemplo: alunos do MIT foram reunidos para fazer uma prova de matemática. Eles tinham 5 minutos para resolver vários problemas. Ao fim do tempo, deveriam rasgar a prova, dizer quantas questões haviam feito e ganhar dinheiro por elas.
O resultado: vários alunos mentiram, porque sabiam que não seriam pegos. Mas, num dos testes seguintes, os alunos tiveram de jurar sobre a Bíblia que não iam enganar os pesquisadores. E eles não mentiram - nem mesmo os ateus. Ou seja, não tiraram uma conclusão em função dos benefícios do dinheiro e do risco de serem pegos. O raciocínio deles foi orientado pela moral, e isso inclui aqueles que supostamente nem acreditam na Bíblia.
É difícil entender por qual razão, a cada dia que passa, ganha mais força, nas faculdades de Direito, as teorias que apregoam o racionalismo decisório.
A tomada de decisões envolve questões que, não raro, passam desapercebidas. Recentemente, um estudo sobre o "viés de ancoragem" testou se tal viés afetaria a decisão de juízes experientes.
Os resultados mostram-se, no mínimo, inquietantes.
O estudo selecionou 52 juízes alemães, com média de 27 anos de idade e lhes expôs um caso criminal em que a ladra havia furtado itens de um supermercado pela 12ª vez.
Os juízes deveriam, antes de cominar a pena, lançar dois dados que lhes foram entregues com o objetivo de determinar qual seria a pena requisitada pelo promotor. Os dados entregues eram viciados e, por isso, a soma sempre correspondia a 3 ou 9. Após visualizar os resultados, os juízes realizavam o cálculo da pena.
A análise dos resultados demonstrou que a pena sugerida pelos juízes estava ancorada nos números que apareciam nos dados, embora acreditassem, piamente, na racionalidade de suas decisões. Os juízes em que o par de dados teve como resultado 9 cominaram, em média, uma pena de 8 meses. Os juízes cujos dados tiveram como resultado 3, alcançaram, em média, a pena de 5 meses. O “viés de ancoragem” foi de 50%.
A influência do inconsciente sobre o cálculo da pena também deveria impressionar os defensores do racionalismo decisório. Estudos sobre a influência do recebimento de seguro concedido à vítima e a punição dada aos criminosos trazem resultados interessantes.
Em um dos testes realizados durante a pesquisa, 29 estudantes universitários com idade média de 19 anos foram questionados sobre qual seria a pena de um criminoso pelo roubo de uma câmera. Os universitários foram divididos em dois grupos para analisar o caso, sendo que, no caso entregue a um dos grupos, a câmera era segurada contra roubo, o que garantia o recebimento de novo aparelho pela vítima do roubo.
Cada um dos participantes do grupo deveria escolher o número de dias de serviço comunitário, mínimo de 1 e máximo de 20, que corresponderia à pena do ladrão. Os resultados demonstraram que os estudantes expostos ao caso da câmera segurada tendiam a punir o ladrão menos severamente (média de 9 dias) em comparação àqueles expostos à câmera sem seguro (média de 13 dias) de serviço comunitário. Esses dados demonstram que, apesar de o bem furtado ter sido o mesmo, a mente humana é condicionada a dar maior valor ao bem sem seguro, agindo esta garantia, embora seja um fator independente da vontade do ladrão, como um elemento amenizador de sua pena.
Em outro experimento, os autores reuniram 113 estudantes universitários, com média de 20 anos, para determinar qual seria a opinião sobre a influência do seguro no cálculo da pena. Os universitários foram divididos em três grupos para analisar o caso: um em que havia seguro envolvido, um sem seguro e outro em que eles eram expostos a ambas as situações.
Neste teste, o caso se referia à batida de carro, ficando o carro da vítima danificado enquanto o automóvel do responsável pelo acidente não sofreu avarias. O autor fugiu do local mas, algum tempo depois, foi preso pelo ilícito cometido. No entanto, no período entre os acontecimentos, o veículo foi totalmente reparado. Os indivíduos teriam então que aplicar pena de serviços comunitários entre 1 e 20 dias ao autor.
Cada um dos indivíduos que analisou apenas uma das situações foi questionado se puniria o autor de forma diferente com base no seguro. Os resultados demonstraram que 81% destes universitários consideram que o seguro não deve interferir na pena. Quanto aos estudantes que analisaram ambas as situações, 79% fixou penas iguais nos dois casos. Estes dados refletem a crença de que crimes iguais devem ser tratados de forma igual, independente de seguro. No entanto, a mente humana está condicionada a punir mais severamente os crimes quando não há seguro, fato comprovado pela média das penas cominadas ao mesmo crime pelos grupos que analisaram apenas uma das situações, sendo de 6 dias em caso de existência de seguro e 8 em caso de sua ausência.
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